Simone
de Beauvoir nasceu em uma família pequeno-burguesa parisiense em 9 de
janeiro de 1908. Sua mãe, muito católica, garantiu que ela e sua irmã
mais nova, Hélène (apelidada Poupette), tivessem uma educação
conservadora no tradicional Institut Adeline Désir, o Cours Désir, onde
meninas eram formadas para serem esposas dedicadas, mães de família e
donas de casa. Foi na escola, aos dez anos, que Simone de Beauvoir
conheceu sua melhor amiga da infância e juventude: Elisabeth Mabille,
mais conhecida por seu apelido, Zaza. A morte de Zaza, quando ambas
tinham por volta de 20 anos, foi uma das mais doloridas perdas da vida
de Simone.
Apesar de ser sempre a melhor – ou segunda melhor – aluna da classe, a
formação conservadora não conseguiu aplacar os desejos de liberdade da
jovem Simone. Aos 13 anos, ela estava decidida a se tornar escritora.
Simone, adolescente, começou a escrever diários e tentativas de
romances. Aos 14 anos, deixou de acreditar em Deus, embora fizesse dessa
descrença um segredo para a família e as colegas do Cours Désir. Aos
15, Simone tem sua primeira paixão: seu primo Jacques. A família
desejava o casamento, mas aos poucos ela percebe que a relação – que
nunca chegou a se configurar como um namoro – não teria futuro.
Em
1926, entrou para a Universidade de Paris – Sorbonne, no curso de
Filosofia. Eram seus colegas de faculdade futuros intelectuais como
Simone Weil (com quem se revezava no lugar de primeira aluna), Claude
Lévi-Strauss, Maurice Merleau-Ponty. Em 1929, quando preparava seu exame
de agrégation, Simone de Beauvoir conheceu o também aluno da
Sorbonne Jean-Paul Sartre. Pouco mais velho que Simone, Sartre era
polêmico na universidade, considerado um jovem gênio, mas havia sido
reprovado no exame de agrégation em 1928 e refazia, então, sua
preparação. Ambos foram aprovados no exame, Sartre em primeiro lugar;
Simone, em segundo, como a pessoa mais jovem e a nona mulher a obter o
título, que permitia ensinar Filosofia nas escolas francesas.
A morte de Zaza, que Simone atribui a condições ligadas ao
conservadorismo da família, o inconformismo com o tratamento
diferenciado para homens e mulheres, os conflitos com as restrições
impostas por sua própria família levam Simone a romper com os padrões de
comportamento considerados aceitáveis para uma mulher na época. Ela se
recusa a se casar, a permanecer na casa dos pais, a sacrificar sua
liberdade por qualquer convenção.
A
partir de 1931, Simone se tornou professora de Filosofia, primeiro em
Marseille, depois em Rouen, e começou a escrever romances em seu tempo
livre. Sua vida passou a ser dedicada à escrita, ao amor e à
cumplicidade afetiva e intelectual com Sartre, à rede de amigos que eles
começam a construir, ao prazer dos livros, das discussões filosóficas,
da descoberta do mundo e das viagens. Sem grandes pretensões, Sartre
começava a pensar sobre o mundo e a esboçar as primeiras teses do que
depois iria embasar o Existencialismo. Tinha em Simone sua principal
questionadora e colaboradora. Juntos, criavam uma doutrina filosófica.
Em 1943, a escritora Simone estava pronta para o mundo. Publicou então seu primeiro romance, A Convidada. Em 1944, O Sangue dos Outros.
Além dos romances, ela se dedicava também aos ensaios filosóficos e,
alguns anos mais tarde, às memórias. Simone é hoje considerada uma das
mais importantes memorialistas do século 20. Em 1945, Sartre e Simone
fundaram a revista Les Temps Modernes,
que atualmente é publicada pelas Éditions Gallimard. Em 1947, ela foi
convidada para uma série de conferências nos Estados Unidos, e lá
conheceu o escritor Nelson Algren, com quem viveu um romance à
distância, marcado por muitas cartas e muitas viagens.
Em 1949, após longa pesquisa, ela publicou: O Segundo Sexo, primeiro grande e detalhado ensaio sobre a condição da mulher.
Apesar de Simone não ser feminista à época, o livro se tornou o mais
importante trabalho de reflexão filosófica e sociológica sobre a mulher e
ajudou a traçar os caminhos do feminismo a partir de então. O livro é
uma análise sobre a hierarquia dos sexos e a opressão da mulher em
termos biológicos, históricos, sociais e políticos.
Para
a sociedade da década de 1950, o livro foi um escândalo. As reações
contra a obra foram violentas. Direita e esquerda passaram a ter algo em
comum: reprovavam veementemente as ideias de Simone de Beauvoir,
sobretudo aquelas expostas no capítulo sobre a maternidade, em que ela
falava sobre o direito ao aborto. A Igreja Católica incluiu o livro no
Index, a lista de obras proibidas. Com a repercussão do livro, a
permanêcia de Simone em Paris se tornou insustentável e ela partiu em
viagem com Algren pela Europa e norte da África.
Entre
os anos 1950 e 1960, a ação política de Sartre colocou o casal em
evidência no mundo. Eles viajaram à então União Soviética, à China, à
Suécia, ao Brasil. Ambos eram definitivamente reconhecidos por unir sua
força intelectual ao engajamento político. Em 1954, Simone publica Os Mandarins,
por muitos considerado seu melhor romance. O livro lhe rendeu o Prêmio
Goncourt daquele ano. Todas as atenções se voltavam, então, para a vida
intelectual, mas também sexual e amorosa de Simone. Depois de Os Mandarins, Simone começou a trabalhar em seus livros de memórias: Memórias de uma Moça Bem-Comportada (1958), A Força da Idade (1960) e A Força das Coisas (1963). Publicou também vários ensaios, relatos de viagens, a obra em que fala sobre a morte de sua mãe, Uma Morte Muito Suave (1964), e a novela A Mulher Desiludida (1967).
Nos anos 1970, Simone de Beauvoir publicou o quarto volume de suas memórias, Balanço Final
(1972) e passou a apoiar oficialmente as ações do movimento feminista.
Em 1974, criou a Ligue du Droit des Femmes. Ao final da década, Sartre
estava seriamente debilitado, sua saúde frágil não permitiu que ele se
recuperasse de uma pneumonia. Ele faleceu em 15 de abril de 1980. Pouco
mais de um ano depois, em maio de 1981, morreu Nelson Algren. Simone
enfrentou as perdas com lucidez e refletiu sobre a morte em seus últimos
escritos. A Cerimônia do Adeus (1981) foi o último livro publicado em vida pela escritora, filósofa e memorialista. Sua saúde começou, então, a se debilitar.
Simone morreu em 14 de abril de 1986, um dia antes do aniversário da
morte de Sartre, tendo realizado seus dois sonhos de infância: o de se
tornar escritora e o de ser uma mulher independente. Mas também sem
realizar um de seus maiores desejos desde que conheceu Sartre: o de que
seu companheiro de toda a vida não morresse antes dela.
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