Na obra o Banquete, do filósofo grego Platão encontramos o Mito do Andrógino.
Não
entenda mito como mentira, fábula ou conto de fadas. Os mitos são
histórias nascidas da alma coletiva dos seres humanos ( segundo Jung são
Arquétipos). Intuições profundas da mente inconsciente transformadas
pela magia das palavras em contos, lendas e mitos.
O andrógino, mais do que ser um e outro, homem (andros) e mulher (gynos), como a maioria em geral pensa, é um só ser.
Andrógino
é o ser quase perfeito porque, assim como os deuses, ele contém em si
mesmo todas as oposições, ele se basta a si mesmo, é completo e fecundo,
dá a luz a si próprio. Em muitas mitologias, assim como na Bíblia o
primeiro homem era um ser andrógino.
No início, a raça
dos homens não era como hoje, era diferente, não haviam apenas dois
sexos. Segundo o livro "O Banquete", de Platão, existiam três criaturas
míticas proto-humanas.
No livro, o comediógrafo Aristófanes descreve como haveriam surgido os diferentes sexos.
Havia antes três
seres: Andros, Gynos e Androgynos, sendo Andros uma entidade masculina
composta de oito membros e duas cabeças, ambas masculinas, Gynos
entidade feminina mas com características semelhantes, e Androgynos
composto por metade masculina, metade feminina.
A Mitologia Grega
conta que Zeus declarou guerra ao seu pai Cronos e aos demais Titãs com a
ajuda de Gaia. E durante cem anos nenhum dos dois lados chegava ao
triunfo. Gaia foi até Zeus e prometeu que ele venceria e se tornaria rei
do universo se descesse ao Tártaro e libertasse os Ciclopes e os
Hecatônquiros filhos de Gaia.
Ouvindo os
conselhos de Gaia, Zeus venceu Cronos, com a ajuda dos filhos libertos
da Terra e se tornou o novo soberano do Universo. Todavia, Zeus realizou
um acordo com os Hecatônquiros para que estes vigiassem os Titãs, que
Zeus voltou a aprisionar no fundo do Tártaro. Gaia então se revoltou com
a traição de Zeus e lançou mão de todas as suas armas para
destrona-lo.
Como
vingança ela pariu incontáveis Andróginos, seres com quatro pernas e
quatro braços que se ligavam por meio da coluna vertebral terminado em
duas cabeças, além de possuir os órgãos genitais femininos e masculinos.
Essa criatura primordial
era redonda: suas costas e seus lados formavam um círculo e ela possuía
quatro mãos, quatro pés e duas cabeças com duas faces exatamente iguais,
cada uma olhando numa direção, pousada num pescoço redondo. A criatura
podia andar ereta, como os seres humanos fazem, para frente e para trás.
Mas podia também rolar
sobre seus quatro braços e quatro pernas, cobrindo grandes distâncias,
velozes como um raio de luz. Eram redondos porque redondos eram seus
pais: o homem era filho do Sol. A mulher, da Terra. E o par, um filhote
da Lua.
Os Andróginos
surgiam do chão em todos os quadrantes da Terra, sua força era
extraordinária e seu poder imenso. E isso tornou-os ambiciosos,
levando-os a desafiar os Deuses e a escalar o Monte Olimpo com a
intenção de destronar Zeus e destruir os Deuses.
Reunidos no
conselho celeste, Zeus aconselhado por Têmis, decidiu que ele e os
demais Deuses deveriam acertar os Andróginos na coluna, de modo a
dividi-los exatamente ao meio, para que se tornassem menos poderosos,
sem precisar aniquila-los.
Pois
aniquilar as criaturas significaria ficar sem os sacrifícios, as
homenagens e a adoração. Mas insolência das criaturas era totalmente
inadmissível, e por isso deveriam ser castigadas.
Portanto o Grande
Zeus decidiu deixa-los viver, mas divididos para torna-los mais humildes
e fracos e assim diminuir seu orgulho fazendo-os andar sobre duas
pernas, diminuindo sua força e poder, com a vantagem de aumentar seu
número. A medida que as criaturas eram cortadas em dois.
Apolo ia virando
suas cabeças, para que pudessem contemplar eternamente sua parte
amputada, como uma lição de humildade. Apolo também curou suas
feridas, deu forma ao seu tronco e moldou sua barriga, juntando a pele
que sobrava no centro formando o umbigo, para que eles lembrassem do que
haviam sido um dia.
Seccionado Andros,
originaram-se dois homens, que apesar de terem seus corpos agora
separados, tinham suas almas ligadas, por isso ainda eram atraídos um
pelo o outro. O mesmo ocorrendo com os outros dois seres Gynos e
Androgynos. Andros deu origem aos homens homossexuais, Gynos às lésbicas
e Androgynos aos heterossexuais.
Segundo Aristófanes, seriam então dividos aos terços os heterossexuais e homossexuais, homem, mulher e a união dos dois.
E foi aí que as
criaturas começaram a morrer. Morriam de fome e de desespero.
Abraçavam-se e deixavam-se ficar assim até a morte. E quando uma das
partes morria, a outra ficava à deriva, procurando, procurando...até
morrer também.
Zeus
ficou preocupado com o destino das criaturas, pois se isso continuasse
elas acabariam por se extinguir, então aconselhado por Têmis, ele
ordenou a Apolo que virasse as partes reprodutoras dos seres para a sua
nova frente, para que através do ato sexual pudessem estar novamente
unidos ainda que por alguns momentos. Se antes, eles copulavam com a
terra de agora em diante, se reproduziriam entre eles, um homem numa
mulher. Num abraço, assim a raça não morreria e os Deuses continuariam a
ser adorados e reverenciados.
As criaturas
poderiam continuar vivendo e com o tempo eles esqueceriam o ocorrido e
apenas perceberiam seu desejo por sua outra parte. Um desejo jamais
inteiramente saciado no ato de amar, porque mesmo derretendo-se no outro
pelo espaço de um instante, a alma saberia, ainda que não conseguisse
explicar, que seu anseio jamais seria completamente satisfeito. E a
saudade da união perfeita renasceria, nem bem os últimos gemidos do amor
se extinguissem.
E esta é a nossa história.
De
como um dia fomos um todo, inteiros e plenos. Tão poderosos que eramos
temidos pelos Deuses. É a história também de como um dia, partidos ao
meio, viramos dois e aprendemos a sentir saudades. E é a razão dessa
busca sem fim do abraço que nos fará sentir de novo e uma vez mais,
ainda que só por alguns momentos, a emoção da plenitude que um dia, há
muito tempo, perdemos.
Isto pode ser a
causa do porque entre chineses e os hindus, tenham florescido rituais,
técnicas e filosofias, cujo objetivo era transformar a energia nascida
deste abraço, em energia espiritual, e fazer do sexo o um caminho para
alcançar o divino. Fazendo do ato amoroso algo que de fato pudesse
preencher o vazio de que somos feitos. Alguma coisa forte o bastante,
para nos alçar de novo no caminho até o alto da montanha dos Deuses.
Mitologia grega é linda! Belo texto!
ResponderExcluirOide Carvalho de Moura - professor de Filosofia e História CEM Florêncio Aires.